segunda-feira, 27 de junho de 2011

A carta (Final)



Eu já ficaria irritado com você se o Caleb fosse alguém com o qual eu estivesse me envolvendo afetivamente, um namorado, ou ficante. Você estaria sendo preconceituoso da mesma maneira. Mas embora, eu repito, não te interesse, o Caleb é meu amigo, apenas, da época do colégio. Um excelente amigo aliás, que após voltar a morar na cidade, compreendeu perfeitamente a minha orientação sexual, e não se sentiu constrangido em continuar a sair comigo, a me tratar da mesma forma, embora muitas pessoas, inclusive você pensassem algo diferente da nossa amizade. Quero que você saiba que eu contei da sua conversa com Caterine pra ele. E ele realmente se sentiu sem graça, de tão HUMILDE que ele é. Mas não menos magoado com a atitude falsa que você teve para com ele, fingindo o tratar bem e normalmente, enquanto questionava sobre a vida dele pra outras pessoas.
Peço, encarecidamente para que você não tente conversar sobre essa carta comigo, porque não surtirá efeito algum. O que está feito está feito, e nada do que você me diga ou faça irá mudar o sentimento que me levou a escrever isso. Muito menos tente conversar com Caterine a respeito disso. Ela coitada, me contou isso na inocência, como se não significasse nada. Ela realmente acreditava que você estava preocupado comigo. Como se eu tivesse 5 anos de idade, não é? Ou como se você já não conhecesse Caleb de antes, né? Ele te vendeu um celular de segunda mão, lembra? Deixa eu ver se eu adivinho: na época você pensou: “ha, esse malandro suburbano que anda com meu filho deve descolar um celular baratinho pra mim, porque ele deve mexer com coisas ilícitas, e é mais fácil pra ele conseguir coisas mais em conta.” Como se existisse elite em Happy Mountain. Pra te vender um celular barato ele serve, mas pra ser amigo do seu filho, não? Caterine achou desnecessária e engraçada a sua “preocupação”, visto que ela também conhece Caleb muito bem, talvez pelo fato de ela já ter namorado com ele na época da escola, e por ele ser completamente heterossexual. Mas você deve ter pensado: “se o meu filho que é meu filho virou gay, porque não esse cara...?”


PS: eu percebi a forma ridícula como o idiota do seu amigo Cielo olhava pra mim enquanto eu conversava com o Caleb ontem, antes de você chegar. Sei também que ele alimentava várias fofocas e espalhava mentiras pra você, com a ajuda do enteado dele, na época em que eu namorava o Woodolf Jr. Se ele realmente for seu amigo, peça pra ele cuidar da própria vida.
Não é porque eu sou homoafetivo que todas as pessoas próximas de mim também são. O fato de eu ser gay, não faz de mim um promíscuo, como você pensa, achando que eu to transando com todos os caras que se aproximam de mim. O fato de eu estar com um gay no meu quarto, à luz do dia, enquanto ele, de bom grado, como um favor mesmo, tenta consertar uma cagada que eu fiz no computador, não quer dizer que nós não possamos ser apenas amigos. Francamente, se eu quizesse ficas com o Virtienzo você acha que eu seria idiota de fazer isso de dia, com a porta aberta, no meu horário de almoço? É ofensivo à minha capacidade intelectual! Eu não penso isso de você de graça. Penso pelas suas atitudes comigo. E com minha mãe. E essa carta não é um desabafo só meu. De certa forma, é dela também.
Pai, (se é que essa palavra ainda tem algum significado pra mim). Não adianta. Não adianta você mudar de canal quando passam cenas gays na novela. Não adianta você desligar o noticiário quando há notícia de que algum direito dos homossexuais foi finalmente conseguido, depois de muita luta. NADA MUDA O FATO DE QUE SEU FILHO É HOMOAFETIVO. E a partir de hoje, quem vai sofrer com essa intolerância será apenas você, se ela persistir.

Fico muito grato se você realmente tiver conseguido ler isso até o fim.

:’(


Pai.
A pouco tempo atrás, essas três letras, a mim, teriam muito significado.
Como naquelas vezes em que pensamos numa palavra, e vem logo uma imagem à mente.

Um sinônimo de respeito.
De exemplo a ser seguido.
O mais nítido e confiável dos espelhos.

É realmente uma pena.
Na verdade, é revoltante de uma maneira muito triste.
Que eu venha pouco a pouco perdendo esse referencial.

A mesma figura que, quando eu menino, me fez aprender que cada ser humano é um mundo.
Hoje age como se o mundo fosse ele mesmo.
Isolado.
Ensimesmado.
Alienadamente tomado por uma revolta
que o faz perder o amor do filho.
Gradativamente.

Não era esse cara que brigava comigo todas as vezes em que eu era injusto com a minha irmã, de uma maneira machista, como se eu pudesse mais do que ela, apenas por ser homem?
Não era ele que me deixava horas a fio de castigo quando eu agia de maneira preconceituosa com outrem?
Ou quando eu não tinha espírito esportivo
e me enervava apenas por perder uma partida de pula-macaco?

Onde está esse cara?

Cadê ele?

Cadê esse pai?

Não o sei.

E em virtude disso tudo, é difícil fazer com que minha cabeça não sofra um tilte.
Tamanha é a minha sensação de desagrado.

Como posso aceitar que sua discordância em relação à minha condição sexual, seja engrenagem pra tanta insanidade?
Tanta violência! Tanta agressão!
E até mesmo minha mãe se vê atingida.
É só por ela que suporto o olhar de nojo que aquele cara dirige a mim todas as manhãs.
Ele que não ouse botar às mãos nela novamente.
Senão não respondo por mim.

Preconceito sozinho já é detestável.
Preconceito aliado ao machismo, então, nossa!
É uma receita letal.

E o sujeito que constará na certidão de óbito, adivinhem quem será?
Vamos, façam suas apostas!
Não façam vista! Não se acanhem!

O amor.
O amor que fez um homem se apaixonar por uma mulher.
O mesmo que fez com que os dois juntos, planejassem gerar outra vida.
Amor antes incondicional,
agora condicionado.

É esse amor, que, aos poucos, se faz minguar cada vez mais.

E seria bom que outras pessoas, muito próximas, não agissem como um dois de paus.

...

A carta (Parte III)



Se eu resolver sair daqui, minha mãe sái junto. E eu realmente tenho muita pena dela, porque ela vive em uma situação de total tensão, porque, infelizmente, ela ainda ama você. Mas sei também que falta uma linha bem fina pra arrebentar, pra que esse amor finde de uma vez. Será que é porque você disse que eu só sirvo pra te envergonhar? Ou será que é porque você disse que ela acoberta as “coisas erradas” que eu faço? Acho que não. Acho que a gota d’água foi quando você disse que, se dependesse de mim, ela já teria “dado” pra outro cara a muito tempo. Como se eu cafetinasse a minha própria mãe. Engraçado. Na verdade, isso foi mesmo circunstancial, praticamente planejado pelos deuses. Você fez essa infeliz observação justo um dia depois de eu defender minha mãe de um bêbado idiota que queria dar em cima dela, mas ela estava com medo, porque além de idiota, esse cara é um criminoso, ex-detento, perigoso e traficante de drogas. Ela achou a minha atitude um ato incondicional de amor de um filho para com sua mãe. Até mesmo a Naomi, que estava conosco, e viu a cena, achou muito honrada a minha atitude, e inclusive engraçada, porque eu saí praticamente correndo atrás da minha mãe, pra defendê-la, enquanto o babaca em questão começava a querer se aproximar dela, bêbado. Ela disse que eu parecia um filhote de leão com ciúmes e querendo defender a mãe. Pra você chegar no outro dia e falar uma barbaridade daquelas? É realmente pra minguar com qualquer tipo de amor mesmo.
Continuando, se eu sair daqui, minha mãe sái junto. Aí sim, vai ser a sua ruína PESSOAL, FINANCEIRA E AFETIVA. Entenda como queira. Embora você diga que é o macho-alfa da casa, que você manda, que só você pode aqui, que “a porta da rua é serventia da casa”, você sabe que você é muito menos sem mim, ao menos nos últimos 5 anos, e principalmente, você sabe que não é, nem nunca foi NADA, DEFINITIVAMENTE NADA, sem a ajuda da minha mãe. Então, a partir de hoje, meça milimetricamente seus atos.
O que seria o terceiro motivo pra eu continuar aqui, a mim, já não tem mais tanta importância. Na verdade nenhuma. Eu esperava que com o tempo, e com a volta da sua convivência comigo, você me compreendesse. Realmente, é esperar demais de você. E isso vai muito além de fingir que as coisas não estão acontecendo. Eu não preciso ser aceito por você nem por ninguém. O princípio da aceitação parte do pressuposto de que já existe um grupo superior, com mais direitos e mais razão, que deve se apiedar e aceitar outras pessoas. Não preciso e não quero ser aceito. Quero ser compreendido enquanto ser social, econômico, político, místico, ideológico, e porque não, sexual.

Com direito a acróstico no fim...




Só você.
Só você pra me fazer acordar, a uma da manhã, pra atender a uma ligação a dois cômodos de distância.

Só você.
Só você pra me matar de desespero, com um silêncio interminável, antes de dizer ‘alô’.
Com essa voz aveludada, que me faz odiar os deuses, por você estar longe.

Desculpas não são mais necessárias.
A mágoa toda se foi.
O meu sarcasmo, ainda não.
Mas logo logo se esvairá.


Afinal,
só você mesmo
pra reascender em mim
o desejo adolescente de
me arrastar da cama de madrugada
pra ouvir canções de amor.

I rreemediavelmente
S eu, sempre.
A mo-te, meu querido.
A ntes de todo o resto e
C om tudo o que de bom há em mim.

A carta (parte II)



Você teve todas as chances de tentar alguma reaproximação comigo, depois de tudo o que aconteceu desde setembro/outubro do ano passado. E temos de concordar que as vaquinhas que são algumas de suas irmãs contribuíram muito pra que você se afastasse e perdesse o amor do seu filho. Eu sei que isso aconteceu, isso de eu ter perdido o amor e o respeito pela figura que eu tinha de um pai, porque não to nenhum pouco nervoso ao escrever isso, nem com raiva, ou menos ainda chorando. O que é de se admirar, ao considerar a pilha de nervos que sou eu. Eu te respeito, a partir de hoje, na sua condição de ser humano, e não de pai. Pois sei que todo ser humano deve ser respeitado, independente de sua crença, etnia, nível social e orientação afetiva. Engraçado né? Muito disso eu aprendi com você, quando você ainda era alguém em quem eu me espelhava. Queria lhe pedir o mesmo respeito, se não for muito difícil pra você.
Queria aproveitar e lhe agradecer os 18 anos relativamente bons que você me proporcionou. Digo “relativamente” porque desde cedo tive de conviver com as piadas e observações preconceituosas e racistas que você fazia. E isso contrastava de maneira muito confusa com os ideais que você me passava, de respeito e compreensão para com o próximo. E eu não tenho dúvida nenhuma de que esse exemplo que você me passava de pai, essa confusão que você armava na minha cabeça, foi motivo circunstancial, aliada à minha pré-disposição biológica, para que eu tenha desenvolvido essa fragilidade psicológica que possuo. Te agradeço imensamente por ter compreendido ao menos isso, e me ajudado bastante, a esse respeito. Mas não se trata de muito mais do que eu faria por um filho meu.
Quero que você saiba que há vários motivos pra que eu não saia definitivamente da sua vida. Um deles é que eu não vou deixar a minha mãe à mercê de um cara que na primeira crise de INTOLERÂNCIA/MACHISMO/PRECONCEITO (escolha o substantivo que julgar mais desprezível) vai encostar as mãos nela de novo.
Embora eu já tenha dito que te desprezo, enquanto filho, quero repetir que te respeito muito enquanto ser humano. E de certa forma, me apiedo de você, se realmente essa história seguir os rumos que a suas atitudes atrozes têm ditado.

Vômito de emputecimento



Nossa...
Como é grande a minha vontade de matar você!
E te picar em mil pedacinhos.
E te passar no moedor de carne!

Te fritar.
Te queimar em uma fornalha ardente,
Até que você vire pó.

Te cremar.
E dar seus restos mortais pras piranhas do Rio Ganjis.
E eu nem tenho certeza se existem piranhas lá.

Há! Vá de uma vez pro inferno.
E me polpe de algumas rugas,
Seu patétido, imbecil.

A carta (Parte I)



Por favor, só se dê ao trabalho de ler isso se for pra ler na íntegra, do começo ao fim. Se cheguei ao ponto de ter que escrever uma carta pra me comunicar com você, que mora na mesma casa que eu, é porque, realmente, as tentativas de diálogo, compreensão e entendimento já se perderam.
Eu, definitivamente, não quero saber os motivos que te levaram a ter aquela conversa com minha amiga/irmã Caterine, perguntando sobre o meu AMIGO Caleb. MINHA VIDA SOCIAL-ROMÂNTICO-AFETIVO-SOCIAL NÃO DIZ RESPEITO A VOCÊ. SOMENTE A MIM. Nem antes, quando eu me enganava, ficando com mulheres, e enganava as pessoas a meu redor, fingindo ser alguém que não era, muito menos agora, que ESTOU COMPLETAMENTE SEGURO DE MIM E MUITO FELIZ COM A MINHA CONDIÇÃO EXISTENCIAL-AFETIVO-SEXUAL. Você sabe muito bem do que eu estou falando.
Eu sou homem, HOMOAFETIVO, tenho 22 anos de idade, e não sou ingênuo, ou bobo. Há muito deixei de sê-lo. Independente de qual tenha sido o motivo que tenha te levado a perguntar sobre o Caleb, pra Caterine, de todas as maneiras, saiba que você está completamente errado a respeito dele. Eu posso querer me enganar, e fingir que você não foi PRECONCEITUOSO/HOMOFÓBICO E INTOLERANTE com sua atitude. Mas se isso não tiver acontecido, você foi, no mínimo RACISTA E/OU ELITISTA. É por causa da cor da pele dele? Ou será que é porque ele se veste de maneira simples? Ou ainda porque sempre morou num bairro de subúrbio? Realmente, vindo de você, posso esperar qualquer coisa. E de qualquer uma das formas, sua atitude foi NOJENTA E DESPREZÍVEL.
Se não for pedir muito, queria que a partir de hoje você me tratasse como funcionário, apenas, e não como filho. E parasse de fingir que se preocupa comigo, com quem eu ando, ou o que faço. Se você realmente se importasse com o que eu estou sentindo, você perceberia que eu me sinto extremamente ofendido quando você caçoa alguém de brincadeira, usando os termos “viadinho”, “boiola” ou “baitola”. Desde quando a condição sexual das pessoas deve ser motivo de chacota? Acorda cara! A era medieval já acabou a séculos. Quem é você pra se considerar melhor que os outros? O que te convence de que você ainda pode fazer piadas racistas em voz alta no seu ambiente de trabalho? Racismo é crime sabia? Dá cadeia. Em certos casos, é inafiançável. Homofobia ainda não, infelizmente. Mas assédio social e assédio moral também já estão na constituição como atitudes criminosas.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Asco



É tudo tão incerto...
...e a podridão toma conta do coração humano.
O ódio é espalhado pelo vento
e inalado por narinas convulsivas,
desejosas de dor.

Nas casas, as crianças se contaminam com o preconceito e a intolerância,
ambos propagados pelos próprios pais,
tidos como ícones de proteção.

Nas escolas, a violência se generaliza,
o bullying se banaliza,
e o desrespeito impera.

Às vezes, sinto vergonha do ser humano.
às vezes, como eu queria não ser humano!

Preferiria gozar da irracionalidade não mascarada.

Espera




Realmente.
Sou muito mais forte do que pensava.
Com o perdão do dramalhão,
pensei que iria morrer
quando ele não me deu a resposta prometida,
e tão esperada quanto um rim,
por alguém que aguardava há tempos
na fila do transplante.

De início, pensei eu que não conseguiria respirar
e formular uma frase curta, ao mesmo tempo.
Minhas pernas tremiam.
Meu corpo inteiro tremia,
ao vislumbrar, em pensamento,
a vibração de seus lábios nos meus.

Quisera eu que isso passasse de um devaneio.

O tempo ainda corre.
A resposta não foi dada.
Meu coração infla cada vez mais em meu peito.
Mas ao mesmo tempo frita, como uma porção de bacon.

Quem sabe não aparece logo outro glutão
e se delicia dele?

Não digo que é o que quero.
Mas pode ser que não demore a ocorrer.

Contraditoriamente,
com seu nome de imperador,
e toda a pompa e biotipo de um rei,
ele age como um lacaio
esperando por minha ação.

Eu perco cada vez mais a dádiva da paciência.