quinta-feira, 8 de setembro de 2011

LOOK INTO MY EYES



Olhar. Porta de entrada para a percepção do mundo de uma maneira ímpar: forma, tamanho, cor, comprimento. Mas, principalmente: sentimento. Num lampejo de olhar se revelam emoções escondidas, guardadas à chave, no mais obscuro recôndito da alma. Nesse aspecto, o olhar é traidor.
Como explicar aquela sensação entorpecente, aquele fritar de neurônios, aquela (desculpem a pieguice) agitação de borboletas no estomago que se seguem, após percebermos visualmente um olhar que chamou a atenção?
O resto do seu corpo consegue esconder, às vezes. Talvez se entregasse, ao sentir o toque do outrem. Talvez seu infame segredo fosse descortinado pelo tato, nessa situação. Mas do olhar, há! Desse você não escapa, em circunstância alguma.
E não são apenas o amor, o carinho, os ditos sentimentos puros, que podem ser revelados, em um olhar de esguelha. Quem nunca se enrubeceu (ou se enfureceu) ao perceber que está sendo literalmente secado por olhares de luxúria, de lascívia? É como se tudo o que há em você, que o diferencia das outras pessoas (geralmente, todo o seu melhor), estivesse sendo sugado por aquele canal visual. E é muito difícil não se deixar intimidar. Talvez não seja à toa que as variações de movimento do globo ocular também sejam levadas em conta, nos testes de detectores de mentiras.
E mesmo outras emoções podem ser reveladas, pela luz dos nossos olhos. Prova disso são as viradas de olhos, as piscadelas, os olhares de inveja, o olhar vítreo, dentre outras. Exatamente por isso, muitas expressões relacionadas ao tema ganharam fama, como: o olho que tudo vê, o olho do furacão, o olho do c... ...Bem. Vocês me entenderam.
Logo, podemos constatar que o olhar é, de certa forma, dantesco. Tanto pode nos ajudar quando precisamos, por exemplo, conquistar alguém (nos levando aos céus), quanto pode nos trair, nos revelando, nos momentos em que queremos parecer invisíveis (nos mostrando a face do mais impiedoso inferno). Basta a nós sabermos como usar dessa arma tão sedutora, e tão letal. E quando se deixar entregar a ela.

De volta para o futuro de deus sabe quando



Era 22 de abril de 1500. Não sabia exatamente como, mas, eu, Pedro, nascido em 1988, estava numa nau, de velas brancas com cruzes vermelhas.
A última lembrança da noite passada era a de que eu havia tomado muita tequila com meus amigos, e adormecera, ouvindo Rihanna no meu Ipod. Agora eu acordava, atordoado e com uma bruta ressaca, com o cheiro da maresia a invadir minhas narinas, e uns caras com uns chapéus esquisitos me rodeando, falando uma gíria engraçada.
- De onde surgiu este “gajo”? – dizia um.
- “Ora pois”, lá saberei eu? – o outro respondia.
- Olhe estas vestes! E este cabelo! Santa Guadalupe! Acha que os deuses do mar estão a nos mandar um demônio em forma de gente? – questionou o primeiro. - Dá cá o monóculo! Acho que estou a avistar algo a além-mar. - Vou consultar a bússola.
Eu, então, não contive o riso e falei: - Já ouviram falar em GPS?
- Terra à vista! – um certo xará gritou.
Como que num passe de mágica, atracamos em uma gigantesca ilha, de vegetação densa, muitas aves coloridas voando, assustadas e índios, muitos e muitos índios, com os arcos erguidos, olhando-nos, com cara de espanto.
Agora entendia. Eu estava mesmo vivendo o episódio do descobrimento do Brasil. Mas seria possível? Há, sim, seria sim. Aquelas formosas índias, com suas vergonhas lindíssimas de fora não poderiam ser devaneio.
- Ainda estás em minha vista? – disse um portuga – Não podeis ser um demônio então. Já que estás aqui, dá cá uma mão. Estabeleça contato com esses boçais.
E então me empurraram para fora da embarcação. Me assustei quando senti a areia fina e fria em meus pés. E me lembrei de George, meu amigo retardado jogando meus chinelos por cima do muro, na casa do vizinho, na noite anterior. Porém, a flecha apontada pra minha testa me assustou mais.
Eu não sabia o que fazer. Se aquilo fosse um sonho, que eu despertasse logo. Com a morte me espreitando, e o coração a saltar pela boca, eu observava aqueles nativos.
Quantas pessoas não gostariam de estar ali, contemplando aquele momento? Ver a selva de pedra substituída por uma mata praticamente virgem, uma flora intocada. O ar fresco e respirável substituindo as nuvens de poluição da cidade. Não fosse o perigo iminente da morte, não sei bem se quereria mesmo acordar, ou sair dali.
De repente, meus pensamentos foram interrompidos, quando o índio ameaçador puxou meu braço, bradando:
- Recuso-me! Recuso-me!
Recusa-se a que? – pensei – A estabelecer um contato amistoso comigo? A gastar uma flecha boa, pra ter no café da manhã a carne sem graça de um branquelo sem sal? Peraí. Um índio falando português?
E então tudo sumiu. Por um atmo de segundo achei ter sido engolido por um buraco negro. Até que despertei assustados, com os mesmos solavancos no braço. Mas agora, não era um índio que gritava:
- Escusa-me! Escusa-me!
Um italiano, muito bem vestido, me acordava. Eu estava deitado num gramado frondoso, avistando a Torre de Pisa, com a minha companheira fiel, não me deixando esquecer que o que eu vivia não podia ser real – a infeliz ressaca da maldita tequila.
- José Cuervos dos infernos – sussurei, jurando a mim mesmo que nunca mais beberia tequila na vida.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Homenagem



Ketlen é uma amiga muito especial.
Com seus vinte e poucos anos
(três, se não muito me engano),
seus cabelos negros como o breu,
e seus olhos castanhos,
conquistou meu coração.

Ela é baixa, de uma altura compacta.
É fofinha, e tem um sorriso lindo,
de uma forma luminosa.

É teimosa como uma porta.
Orgulhosa como um pavão.
E impetuosa.
Não compre uma briga com ela,
se pretende ter filhos um dia.

Mas o que mais me marca, em relação a ela
é sua total entrega.
Ela sempre está ali, quando preciso.
Totalmente prestativa.

Seja pra me dar a mão em uma emergência de trabalho,
ou chorar comigo, quando sofro de alguma desventura amorosa.
E olha que são várias.

E como ela corre!
Corre pra conseguir criar o filho.
Corre pra conseguir seguir com a vida.
Corre com seu amigo maluco,
por uma lombada eletrônica,
em uma infame tentativa de contornar
a dor de uma perda.

E eu que achava que aquele marcador sairia mesmo do zero.

Amo-a, simplesmente.
Apenas por existir.

domingo, 4 de setembro de 2011

Nostálgico


Impreciso.
Impreciso e aluado coração.
Que anseia por esquecê-lo, mas não consegue.

Expressiva.
Expressiva e exacerbada a emoção.
Quando me vem as lembranças, do mundo que tu trouxestes

Que tu trouxestes contigo.

Pra acalentar o meu colo,
e fervilhar meu desejo.
Fazer-me esquecer do prumo
e ultrapassar o gracejo.
Intensos lábios febris
se entregando, num beijo.

Ha!
Quisera eu poder esquecer-te assim
como se esquece de uma valsa de pouca fama.

Embotarei então meu coração
num desafogo solitário.
Até que meu amor por ti mofe.


Sozinha



Emerenciana agora estava ali,
sentada à mesa de seu escritório,
bebericando o peso das palavras mortas,
juntas ao café amaríssimo.

Jocasta se fora,
levada por um furacão do Norte da América,
em sua viagem sem fim.

Emerenciana jamais imaginaria que sua finitude estivesse tão próxima.

- Rosas ou madressilvas? - Jocasta perguntava, em meio a carinhos - Que flores enfeitarão nosso quarto de núpcias?
- Jocasta - Eme dizia, em pensamento, e em tempo real - Jocasta será a flor de meus sonhos.

Eternamente.

Pedro e a pedra



Era Pedro um pescador.
Estava ele à beira do Rio Guaíba
pescando peixe piranha
pra desafogar preocupação.

Há cerca de vinte dias está fugido.
Com a polícia de Itariti em seus calcanhares.
O último refúgio acolhedor fôra a fazenda
da tia de 3° grau. Nha Laureta.

Mas os perigos das rondas policiais
o fizeram retomar as andanças.

Agora ele habitava uma caverna antiga,
morada de raposas do campo,
que Pedro já emboscara e degolara,
pra saciar a fome.

Todos esses reveses por conta de uma infeliz atitude.
Estar apaixonado pelo filho do juiz.

Em suas reflexões, Pedro interloutava consigo mesmo,
ou com a lua, ou com uma pedra:

- Estou a cometer um crime?

E a pedra não respondia.

E Pedro permanecia ali.

Pedro e a pedra.
Fugindo do mundo, por não lhe deixarem viver.

Mudando a ordem dos fatores



Sou brasileiro, de estatura mediana.
Gosto muito de Joana, mas Joelma é quem me quer.

Noites e noites a fio, passei à espreita,
cantando, ao primeiro sinal de movimento,
com o acompanhamento do violão,
à Janela de Joana.

Mas ela nem me dava bola.
Era Joelma quem ralhava comigo, no outro dia de manhã.

É certo que Joelma também é graciosa.
Tem seus lábios fartos,
a pele de um tom moreno, quase âmbar,
e era bem sapeca na cama.

Sim, já transei com Joelma.
Mas foi com Joana que fiz amor.

Pena que as duas tenham trocado a ordem dos fatores
em seu jeito de sentir.


Desabafo de um florista



Meu Deus!
Que tempo é esse em que falar de flores é quase um crime?
Se entro em um bar e começo a falar de begônias e cravos,
ao invés de me gabar do mais novo software,
ou questionar sobre ações da bolsa e futebol,
sou quase expulso!

Mas não me envergonho de ser florista.
E nem de ser avesso às tecnologias.
Sei que, quando eu morrer,
não serão as micro-telas de ledge
que enfeitarão meu túmulo.
E sim, as rosas.

Meu namorado Bento que não me ouça, mas
com elas, até amenizo o odor de seus pés descalços,
quando chega do treino diário.

- Como estão as orquídeas hoje, Nicolau? - me perguntam.
Respondo:
- Estão lindas! Cuido delas como se fossem filhas minhas!

No que depender de mim, tudo são flores, com certeza.

sábado, 3 de setembro de 2011

João Brasileiro



João Brasileiro já não sabe até quando mais suportará.
Olhando os transeuntes, percebe nitidamente as sutis diferenças
entre as pessoas.

Um piercing aqui, um cabelo pintado acolá.
Tatuagens de rena, tranças de raiz,
cabelo chanel.

Mas a principal diferença não se percebe
ao lampejo do olhar.
As nuances da alma.

João Brasileiro se enerva, ao se obrigar a
esconder-se de si mesmo.

Com dois filhos pra criar,
uma esposa que não ama
e um desejo compulsivo,
que o faz sentir algo,
como se despejassem despejassem alvejante em suas artérias.

João Brasileiro não sabe mais
se conseguirá refrear seus impulsos